Deputado Federal Milton Coelho (PSB/PE) – Coordenador de Orçamento Público da Frente Servir Brasil
Em setembro de 2020, Bolsonaro entregou ao Congresso Nacional a PEC 32/2020, projeto de Reforma da Administração Pública, elaborada pelo ministro Paulo Guedes e sua equipe e hoje sob a análise da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal. O discurso do governo no envio desta PEC é o de que nossa Administração Pública precisa ser modernizada, porque é ultrapassada e conta com uma grande massa de servidores cheia de privilégios. Ora, nenhum de nós, em sã consciência, quer um Estado defasado e no qual os servidores representem um grupo repleto de regalias. Porém, a proposta do governo não só deixa de lado os servidores realmente privilegiados, como também traz aspectos claros de tirania.
Seu conteúdo é tirânico, pois, sob o pretexto de modernizar a máquina pública, o governo nos apresentou um projeto que dá superpoderes ao presidente e pode destruir todo o corpo profissional do Estado brasileiro. Com a PEC 32, teremos um enorme contingente de profissionais da esfera pública que nunca poderá dizer não às arbitrariedades dos governantes. Isso, entre outros, por dois motivos principais. Primeiro, a proposta cria a figura dos servidores por tempo indeterminado e sem estabilidade – podem atuar na administração pública até que alguém de cima deseje lhes demitir.
Em segundo lugar, o projeto prevê a criação de cargos de confiança sem nenhum critério técnico de ocupação. Hoje, essas funções têm cotas para servidores públicos, ou seja, uma proporção delas deve obrigatoriamente ser assumida por concursados. Isso existe para evitar a nomeação de pessoas sem nenhum entendimento da área na qual vão trabalhar e a manipulação da máquina pública por interesses privados. Imagine o nível de desmandos que o governo poderá cometer se a maioria dos profissionais do Estado possuir vínculos frágeis e for composta por apadrinhados políticos?
Mas o despotismo não para por aí: com esta PEC, o presidente pode decidir sozinho e sem nenhum diálogo com o Congresso Nacional a respeito da junção ou extinção dos órgãos da Administração Pública. Se esta proposta estivesse vigente, Bolsonaro poderia dar fim à FUNAI, ao ICM Bio ou à Fundação Palmares numa canetada, por exemplo. E nós, parlamentares eleitos para representar o povo, nada poderíamos fazer.
Além de seu conteúdo, a PEC 32 também é tirânica pelo momento em que se apresenta. Temos crise sanitária, recessão econômica e um orçamento profundamente aquém do necessário para enfrentar os desafios. É hora de discutirmos vacinação, o fortalecimento do nosso Sistema Único de Saúde, a criação de empregos e a retomada das aulas. De pautarmos uma reforma tributária progressiva, que aumente os recursos para os serviços públicos e diminua a desigualdade.
Mais ainda, é o momento de valorizarmos a imensa maioria dos servidores concursados que tem batalhado para manter os serviços públicos de pé, entre eles os profissionais de saúde que, sob condições esgotantes e precárias de trabalho, seguem tentando preservar vidas. Mas, com sua tirania míope, o governo prefere pressionar o Congresso a discutir uma Reforma que fragiliza a atuação do Estado e gastar o tempo manchando a imagem dos servidores públicos para toda nossa população.