A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público (Servir Brasil) promoveu, nesta sexta-feira (13/8), o seminário “Os impactos da Reforma Administrativa na população do Distrito Federal”. Realizado na Câmara Legislativa do DF (CLDF), o evento reuniu parlamentares, especialistas e representantes de entidades ligadas ao funcionalismo público.
Em formato híbrido, com a presença dos convidados da mesa na CLDF e com o público acompanhando e participando pela internet, o seminário introduziu o debate da PEC 32 no Congresso Nacional e depois fez um recorte temático, discutindo o efeito em áreas específicas. Saúde, assistência social, órgãos de polícia, fiscalização e controle, e educação foram alguns dos temas das mesas, que ocorreram entre 9h e 17h.
O coordenador político da Servir Brasil, Jorge Ramos Mizael, abriu o dia explicando a proposta do governo de Jair Bolsonaro de Reforma Administrativa. “Havia sido colocado que seria apresentado nos primeiros dias do governo Bolsonaro. Teve um atraso de 9 meses e o que vinha sendo dito, do ponto de vista de narrativa, sobre desempenho da máquina pública e de corte de privilégios, nada disso estava escrito. Começamos a estudar a alternativa para essa proposta. A primeira era rejeitar e colocar uma com padrões técnicos e modernos”, conta.
Durante a tramitação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados, a Servir Brasil conseguiu conscientizar o relator, o deputado Darci de Matos, sobre a ausência de base técnica e jurídica em relação aos novos princípios, o que foi retirado do texto. Atualmente, a Reforma tem sido discutida em audiências públicas na Comissão Especial. A programação segue até o dia 25. “O que se espera é que o relator, deputado Arthur Oliveira Maia, acate parte das emendas. Do nosso ponto de vista, é uma proposta que atinge todos os brasileiros, não só os servidores e os futuros servidores. Queríamos, então, conclamar a sociedade brasileira para debater essa proposta com o rigor e a atenção devida”, emenda.
Ataque à Constituição Federal
“O servidor público e a PEC 32” foi o tema da primeira mesa, sob mediação do deputado distrital Fábio Felix (PSOL), presidente da Frente Distrital em Defesa do Serviço Público. “Essa mobilização institucional é essencial. As Frentes têm informado os sindicatos do andamento (da Reforma) e estão trazendo informações de relatoria e dados, o que ajuda a mobilizar a sociedade em torno da temática”, afirma.
Professor Israel Batista (PV-DF), presidente da Servir Brasil, destacou que o debate em torno da PEC 32 começou repleto de fake news plantadas pelo próprio governo. “Os servidores caíram nessa falácia de que eles não cairão na PEC. O que a reforma propõe é que os cargos de confiança, que hoje são ocupados por servidores de carreira, sejam liberados para livre nomeação. O governo alega que depois da PEC vai haver regulamentação”, comenta. E completa: “Essa PEC é contra a Constituição de 1988. É aí que o governo de Bolsonaro se insurge”.
A deputada federal Erika Kokay (PT-DF) tem opinião semelhante. “O Brasil já sofre com outras reformas. O que se busca agora é um dos mais profundos ataques a essa constituição de Estado. Por que o governo não trabalha numa proposta de lei complementar sobre a avaliação de desempenho? Podemos fazer uma discussão que o TCU disse que é o principal problema de Estado, que é gestão”, aconselha sobre um dos pontos da Reforma.
Já Gustavo Scatolino, professor de Direito Administrativo do Grancursos online, trouxe para a pauta da conversa a questão da estabilidade. “Não podemos confundir estabilidade com privilégio. É uma prerrogativa do cargo para exercer suas atribuições de fiscalização, administração e poder de polícia. Sem estabilidade, o servidor pode ter receio de perder o cargo ao denunciar alguma irregularidade”, lembra.
Saúde e assistência social
A saúde pública e a assistência social foram os primeiros eixos temáticos do seminário. Jeovania Rodrigues, presidente do Conselho de Saúde do Distrito Federal e que ficou responsável pela mediação, iniciou o debate destacando que a Reforma Administrativa vai reduzir o poder do Estado em prover a saúde básica e pública. “Estamos aqui para dizer para a sociedade que essa PEC não tem nada de bom para a população. A reforma gerará uma desassistência e falta de qualidade dos serviços de saúde para a população”, define.
Para Dayse Amarilio, presidente do Sindicato dos Enfermeiros do DF, houve uma tentativa do governo em demonizar o servidor público. “O Brasil tem muito menos servidores públicos do que os países desenvolvidos. Na reforma, quem tem privilégio não vai perder e a perda de estabilidade vai atuar no dia a dia do posto de saúde. Precisamos de uma Reforma Administrativa coerente”, defende.
Rivana Ricarde, presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos, acredita que a reforma como está é contra a população e o Estado e que, como está, não vai gerar bons resultados. “Queremos um serviço público de qualidade. A reforma tem que investir nesse tipo de serviço”, avalia.
Clayton Avelar, diretor do Sindicato dos Servidores da Assistência Social e Cultural do GDF, apontou outra mudança prejudicial prevista no texto da PEC 32. “Os Estados vão perder a governança de legislar o serviço público. Terão que se adequar ao governo federal”, explica.
Estabilidade e carreiras de Estado
A primeira mesa no período da tarde trouxe as preocupações dos representantes dos servidores de órgãos de polícia, fiscalização e controle em relação à PEC 32. Mediada por Flávio Werneck, policial federal e presidente da Associação Nacional dos Escrivães da PF, a discussão se ampliou para os pontos problemáticos, como os novos princípios, que haviam sido propostos no primeiro texto, a falta da estabilidade e a possibilidade de pessoas sem vínculos com as carreiras de Estado assumirem cargos em áreas técnicas.
“A proposta é tão ruim, que, mesmo na CCJ, começou a ser remendada. Os novos princípios traziam muita insegurança. Esperamos que essa PEC seja enterrada. Não é uma modernização, é um ataque à estabilidade. Traz prejuízos para o controle e para a transparência”, define Bráulio Santiago Cerqueira, presidente do Sindicato do Nacional dos Auditores e Técnicos Federais de Finanças e Controle.
Alex Galvão, presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Distrito Federal, pontuou que a reforma precisa dar garantia aos policiais. “O servidor precisa de algo mais, que lhe dê vontade de sair, executar seu trabalho. Ele precisa ter uma garantia de que a família vai estar resguardada. O policial trabalha com o pior da sociedade”, lamenta.
Para Nivaldo Dias, presidente da Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União, um dos aspectos mais preocupantes na Reforma Administrativa está no Artigo 37, inciso 5. “A PEC vai dar margem para que pessoas sem vínculos com as carreiras de Estado acabem desempenhando atividades em áreas técnicas. Isso é preocupante para toda a sociedade”, alerta.
Pontos preocupantes
A terceira mesa do dia teve mediação de Alison Souza, presidente do SINDILEGIS. O debate também girou em torno dos impactos negativos da reforma. A advogada Fernanda Fritoli, presidente da Comissão de Estudos de Reforma Administrativa do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo, lembrou a essencialidade dos serviços públicos na pandemia. “Nessa época de pandemia, o que salvou o Brasil foi o serviço público. Os pesquisadores, os gestores”, comenta.
Lademir Rocha, presidente da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais, afirmou que a reforma deveria ser algo positivo, no entanto, não é o caso da PEC 32. “Nos espanta que essa reforma sequer tenha avaliado as diretrizes das leis. Uma reforma tem que ter estudos técnicos para ampará-la. Tudo isso falta nessa reforma”, argumenta.
Também participaram Roberto Muniz, presidente do Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais da Carreira de Gestão, Planejamento e Infraestrutura em Ciência e Tecnologia, e Vicente Fialkoski, presidente do Conselho Regional Brasília do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central. Ambos se disseram contra a aprovação da Reforma e convocaram o povo às ruas no próximo dia 18.
Educação
A educação é outra área que deve ser bastante impactada pela Reforma Administrativa. O debate sobre o tema foi apontado pela mediadora Berenice Darc, diretora do Sindicato dos Professores do DF e membro da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, como extremamente oportuno diante do período de “desafios duros” que a educação passa diante da pandemia e da falta de governo de Estado.
Pedro Pontual, presidente da Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas Gestão Governamental, disse que o Brasil precisa parar de usar a questão contábil contra a educação. “Vamos olhar a despesa do Brasil, quanto o País investe em educação. Acho muito difícil alguém achar esse dinheiro suficiente. Não faz sentido usar uma retórica que não tem nenhum respaldo científico”, afirma. Pontual critica a falta de evidências do governo, que não apresentou dados numéricos sobre a Reforma Administrativa.
Os presidentes do Instituto Os Pedagógicos e professores do GranCursos online, Carlinhos Costa e William Dornela, fizeram um discurso em favor da educação e contra a PEC. “Essa PEC deveria ser arquivada por insuficiência de qualidade. Ela traz essa falsa ilusão que economiza. Mas não é isso que vai acontecer. Os objetivos aqui estão centrados numa minoria que vai ganhar com isso”, ressalta Carlinhos.
Denivaldo Alves, secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Escolas Públicas no Distrito Federal, reforçou o convite feito por outros convidados do seminário de que os servidores participem de ato em 18 de agosto contra PEC 32. “Essa PEC tem que ser retirada. Ela não pode passar nem com emenda, ela não nos contempla”, resume.