O ministro Paulo Guedes voltou a afirmar, no domingo (24), que a Reforma Administrativa da PEC 32 poderia economizar R$ 300 bilh\u00f5es no acumulado da pr\u00f3xima d\u00e9cada, simplesmente \u201cpelo disciplinamento e meritocracia nas contrata\u00e7\u00f5es futuras\u201d. Por isso, segundo ele, \u201cn\u00e3o teria problema\u201d dar calote nos credores do Estado e furar o teto de gastos com manobras fiscais, agora por meio de uma outra altera\u00e7\u00e3o constitucional, a PEC dos Precat\u00f3rios (n. 23\/2021).<\/p>\n
Curioso \u00e9 que este mesmo ministro da Economia reconheceu expressamente na exposi\u00e7\u00e3o de motivos da PEC 32\/2020 que \u201ca proposta de Emenda \u00e0 Constitui\u00e7\u00e3o ora apresentada n\u00e3o acarreta impacto or\u00e7ament\u00e1rio-financeiro\u201d, ou seja, que a Reforma Administrativa n\u00e3o tem condi\u00e7\u00f5es de aumentar, mas tamb\u00e9m de reduzir o gasto p\u00fablico, ao menos por si s\u00f3.<\/p>\n
Al\u00e9m disso, ap\u00f3s atua\u00e7\u00e3o da Servir Brasil no Tribunal de Contas da Uni\u00e3o, o Minist\u00e9rio da Economia teve que admitir que n\u00e3o produziu sequer um \u00fanico estudo oficial de impacto or\u00e7ament\u00e1rio-financeiro da PEC 32, nem mesmo para simular poss\u00edveis redu\u00e7\u00f5es do gasto caso fossem editadas leis e outras regulamenta\u00e7\u00f5es subsequentes \u00e0 aprova\u00e7\u00e3o da Reforma Administrativa. As avalia\u00e7\u00f5es existentes e mencionadas na resposta ao TCU reconheciam expressamente que elas n\u00e3o avaliavam o impacto or\u00e7ament\u00e1rio-financeiro da PEC 32 e que eram meros estudos \u201cexplorat\u00f3rios\u201d para formular cen\u00e1rios \u201chipot\u00e9ticos\u201d e, mais importante, n\u00e3o coincidentes com as propostas da Reforma.<\/p>\n
Portanto, fica a pergunta, onde est\u00e3o os R$ 300 bilh\u00f5es de economia, sr. Paulo Guedes?<\/p>\n
A realidade \u00e9 que at\u00e9 agora o Governo Federal foi incapaz de demonstrar de onde a PEC 32 trar\u00e1 uma economia significativa e real aos p\u00fabicos. E talvez n\u00e3o seja s\u00f3 uma quest\u00e3o de incompet\u00eancia, mas de verdadeira inviabilidade.<\/p>\n
A Consultoria de Or\u00e7amentos, Fiscaliza\u00e7\u00e3o e Controle do Senado Federal concluiu que a Reforma Administrativa tende, em verdade, a aumentar o gasto p\u00fablico. Ao avaliar o texto da PEC 32\/2020 enviado pelo ministro da Economia ao Congresso Nacional, a Nota T\u00e9cnica n. 69\/202 verificou o alto risco de aumento da corrup\u00e7\u00e3o pela elimina\u00e7\u00e3o de restri\u00e7\u00f5es a admiss\u00e3o de pessoas n\u00e3o concursadas e pela amplia\u00e7\u00e3o do escopo de contrata\u00e7\u00f5es com a iniciativa privada sem as corretas balizas, favorecendo, assim, a captura do Estado por interesses privados. Por isso, entendeu a Consultoria que a mencionada proposta, \u201cde forma agregada, dever\u00e1 piorar a situa\u00e7\u00e3o fiscal da Uni\u00e3o, seja por aumento das despesas ou por redu\u00e7\u00e3o das receitas\u201d.<\/p>\n
Mas mesmo com as altera\u00e7\u00f5es promovidas na Comiss\u00e3o Especial da PEC 32\/2020 na C\u00e2mara dos Deputados, em que o Relator Deputado Arthur Maia (DEM\/BA) expressamente reconheceu a m\u00e1 qualidade do texto enviado pelo Poder Executivo, n\u00e3o foram superados os problemas da Reforma Administrativa. A PEC 32 continua inconstitucional por sujeitar o Estado brasileiro a prop\u00f3sitos clientelistas e patrimonialistas, ao esvaziar por completo o princ\u00edpio da impessoalidade e da moralidade, e os seus subprinc\u00edpios, como o do concurso p\u00fablico.<\/p>\n
Chega a ser ris\u00edvel que o Ministro da Economia fale em economia pelo \u201cdisciplinamento e meritocracia nas contrata\u00e7\u00f5es futuras\u201d quando a PEC 32 praticamente acaba com os concursos p\u00fablicos \u2013 esse sim um m\u00e9todo meritocr\u00e1tico de admiss\u00e3o de servidores p\u00fablicos \u2013 e libera a contrata\u00e7\u00e3o de apadrinhados pol\u00edticos, por contratos \u201ctempor\u00e1rios\u201d de at\u00e9 10 anos, que ser\u00e3o contratados por mera sele\u00e7\u00e3o simplificada, o que pode ser uma an\u00e1lise de curr\u00edculo.<\/p>\n
A PEC 32 tamb\u00e9m autoriza contratos, sem obriga\u00e7\u00e3o de licita\u00e7\u00e3o, com empresas privadas que visam estritamente o lucro, para a presta\u00e7\u00e3o dos servi\u00e7os p\u00fablicos b\u00e1sicos como de sa\u00fade e educa\u00e7\u00e3o. Na pr\u00e1tica, sabemos onde isso vai dar: a empresa da fam\u00edlia ou dos amigos do pol\u00edtico local fechar\u00e1 contratos milion\u00e1rios escusos, sem concorr\u00eancia, com o poder p\u00fablico para gerir escolas e hospitais p\u00fablicos. Trata-se do financiamento p\u00fablico de interesses privados.<\/p>\n
Tenta-se assim replicar o modelo fracassado das corruptas OSs da sa\u00fade do Rio de Janeiro, mas agora com a novidade de que o lucro destas empresas tamb\u00e9m ser\u00e1 pago pelo or\u00e7amento p\u00fablico. E esse n\u00e3o \u00e9 um caso isolado: na Capital do Brasil, foi na gest\u00e3o do IGES-DF, entidade privada respons\u00e1vel pela sa\u00fade p\u00fablica no DF, que foi descoberto o maior esc\u00e2ndalo de corrup\u00e7\u00e3o da hist\u00f3ria do Distrito Federal, com esquemas de superfaturamento e de outras irregularidades at\u00e9 mesmo na contrata\u00e7\u00e3o de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).<\/p>\n
Portanto, a PEC 32 \u00e9 tudo menos redu\u00e7\u00e3o inteligente de gasto p\u00fablico, quanto mais neste patamar delirante R$ 300 bilh\u00f5es que, repita-se, n\u00e3o tem qualquer embasamento t\u00e9cnico. Doura-se a p\u00edlula para tentar esconder o que \u00e9 \u00f3bvio: O ministro Paulo Guedes e sua equipe, nos mais de 500 dias que tiveram dispon\u00edveis desde o in\u00edcio da pandemia, foram incapazes de construir um programa social fiscal e socialmente respons\u00e1vel, capaz de atender \u00e0s necessidades da parcela mais vulner\u00e1vel da popula\u00e7\u00e3o, que hoje, gra\u00e7as \u00e0 essa incompet\u00eancia, passa fome.<\/p>\n
\u00c9 preciso que o ministro Paulo Guedes pare de mentir aos brasileiros e confesse que n\u00e3o ser\u00e1 a farsa da Reforma Administrativa a salva\u00e7\u00e3o para o buraco fiscal provocado pela irrespons\u00e1vel PEC dos Precat\u00f3rios, que, em verdade, \u00e9 o calote nos credores do Estado e a constitucionaliza\u00e7\u00e3o de manobras fiscais, na tentativa populista de alavancar um Governo em franca decad\u00eancia.<\/p>\n
*Professor Israel Batista<\/em>\u00a0\u2013 Deputado federal (PV-DF) e presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Servi\u00e7o P\u00fablico (Servir Brasil)<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" O ministro Paulo Guedes voltou a afirmar, no domingo (24), que a Reforma Administrativa da PEC 32 poderia economizar R$ 300 bilh\u00f5es no acumulado da pr\u00f3xima d\u00e9cada, simplesmente \u201cpelo disciplinamento e meritocracia nas contrata\u00e7\u00f5es futuras\u201d. Por isso, segundo ele, \u201cn\u00e3o teria problema\u201d dar calote nos credores do Estado e furar o teto de gastos com […]<\/p>\n","protected":false},"author":3,"featured_media":1025,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"spay_email":""},"categories":[10,7,8],"tags":[],"yoast_head":"\n